domingo, 15 de agosto de 2010

Medicação de hiperatividade é polêmica.

08/08/2010


Medicação de hiperatividade é polêmica

Especialistas contrários citam insônia e agressividade como contraindicações; favoráveis apontam a melhora nas relações

Luciana La Fortezza

Se já não existe consenso em relação ao fato do Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) ser doença, a polêmica é ainda maior quando o assunto é a medicação. Apenas neste ano, porém, gastou-se no Brasil R$ 88 milhões com a compra de metilfenidato – fármaco utilizado no tratamento –, segundo dados informados por fontes do JC.

A professora titular de pediatria da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Maria Aparecida Affonso Moysés, por exemplo, é radicalmente contra a utilização de drogas em crianças e adolescentes diagnosticados como hiperativos. Na opinião dela, a relação custo-benefício é “péssima” por conta das reações adversas.

“A lista é enorme. Tem insônia, cefaleia, agitação, agressividade, tontura, alucinação, psicose e a faixa de suicídio não é desprezível. Tem também o ‘zumbi like’, que é agir como zumbi. A hipertensão é em torno de 10%, assustador. Isso em crianças que não têm nada”, comenta.

Já o neurologista Abram Topczweski é adepto ao uso do metilfenidato, quando necessário. “Dipirona sódica também dá morte súbita, antibiótico também pode provocar isso. Efeitos colaterais têm até em função do ar que se respira. Por isso, Imagina-se que o especialista responsável pela receita tenha vivência com o medicamento, com os efeitos adversos, que o saiba controlá-lo para levar ao bem estar do indivíduo. O medicamento foi inventado para melhorar seu estado geral. Será que ela (Maria Aparecida) pensa que no Brasil e nos Estados Unidos, por exemplo, só tem maluco?”, questiona.

Ainda assim, segundo o médico, não é uma medicação utilizada deliberadamente, sendo prescrita em receitas amarelas, mais controladas, embora seja possível encontrar a substância em qualquer danceteria boa da Capital ou do Interior. O preço nas farmácias de Bauru varia de R$ 19,39 (quando deve ser administrada cerca de três vezes ao dia) a R$ 383,00 (de uso prolongado), dependendo da marca.

“O preço não é econômico e o risco é alto demais. O que eu quero saber é a que preço e para que essa criança precisa focar atenção. Por que não presta atenção na tarefa? Não é que não preste atenção em nada. Temos de procurar a causa, questionando, por exemplo, que conflito essa criança está vivenciado?”, diz Maria Aparecida.

Já os questionamentos de Abram Topczweski fazem menção aos sofrimentos e aos prejuízos de crianças e adolescentes diagnosticados com hiperatividade. Na opinião dele, tudo deve girar em torno disso. Quais são os prejuízos de um indivíduo que tem problemas sociais, na escola e na família em decorrência do TDAH?



Escola discute assunto em publicação interna

Com o título ‘A Droga da Obediência”, o D’Incao Instituto de Ensino discutiu o problema da hiperatividade na ‘Folha do Educador’, jornal publicado pela própria instituição. O enfoque principal foi a utilização da medicação em crianças e adolescentes diagnosticados com o problema, o que suscitou o interesse do JC em abordar o assunto numa matéria.

“Nos causou grande preocupação a sucessiva incidência de pais que diziam que seus filhos tinham problemas pedagógicos e eram orientados a passar por uma investigação fisiológica, como se fosse um problema médico”, comenta Carlos D’Incao, historiador e proprietário do instituto.

Ele defende que tais problemas sejam tratados por via terapêutica e não sob a ótica do capital., já que acredita que o capitalismo não só produz mercadorias, como também as necessidades para o consumo de sua produção.

“A indústria farmacêutica não é exceção”, afirma – ao mencionar o grande consumo de metilfenidato no mundo. Porém, acredita que existam resistências a esse modelo consumista que, atualmente, propicia um grande abertura a forças reacionárias.

Na visão de Carlos D’Incao, o cenário também contempla o processo pedagógico uniformizador, segundo o qual o ser humano tem desenvolvimento espontâneo. Sob esse ponto de vista, quem não o atinge corre o risco de ser tratado como se tivesse uma anomalia.

“No nosso entender, o desenvolvimento só ocorre por meio da mediação de alguém mais desenvolvido que ensina o menos desenvolvido”, explica Carlos D’Incao, que segue a psicologia Vygotskyana. “Os alunos não têm sido corretamente estimulados porque espera-se avanços espontâneos. E tem gente lucrando muito com esse universo”, alerta.


Dislexia não tem tratamento

Estudada há mais de 100 anos, a dislexia não tem tratamento medicamentoso, informa Rosemari Marquetti de Mello, presidente da Associação Brasileira de Dislexia (ABD) e que foi diagnosticada com o problema aos 37 anos, quando procurava ajuda para o filho que apresentava dificuldades na escola, embora visivelmente fosse bastante inteligente.

Sem o mesmo respaldo, Rosemari parou de estudar aos 18 anos por conta de obstáculos semelhantes. “Eu me sentia inteligente, mas era vista como incapaz”, comenta.

Após o diagnóstico, procurou terapia, voltou a estudar e conclui no ano passado a faculdade de psicologia. Nos bancos escolares se deparou com dificuldade de concentração e, depois de estudar a questão, inclusive com uma psiquiatra, utilizou o metilfenidato.

“Foi muito importante para mim porque para o disléxico é fundamental ‘ler’ a professora, mas estou falando como usuária”, destaca.

De acordo com ela, para evitar diagnósticos equivocados, a ABD só valida casos de dislexia após minuciosa análise de uma equipe multidisciplinar. “Uma pessoa sozinha não tem condição de avaliar. Não é um problema médico, é educacional em conjunto”, afirma Rosemari, que admite, inclusive, que existe muito charlatanismo na área.

Caps infantil investe no tratamento terapêutico

O Centro de Atenção Psicossocial Infantil (Caps-i) de Bauru investe no tratamento terapêutico com diálogo interdisciplinar, segundo a coordenadora do serviço, Marilza Ramos. “Se não apresentar resultados, abre-se a possibilidade de se fazer avaliação médica. É quando o especialista pode analisar a necessidade de medicação”, informa.



De acordo com Marilza, no mês de julho, 67 crianças com idade entre 7 e 12 anos participaram de tratamento terapêutico, a maioria com dificuldades de aprendizagem e depressão.



“O TDAH não é sozinho, existem outros adoecimentos psicológicos de base. A criança, por exemplo, tem depressão e, como consequência, TDAH. A questão do TDAH não pode ficar só no enfoque psicológico, mas tem que trabalhar áreas de conhecimento com neuropediatra, psiquiatra, fonoaudiologia”, explica Marilza.

Ela entende o problema como resultado de múltiplas determinações. “Por isso, tem de trabalhar família, criança e escola”, conclui.





FONTE DE PESQUISA: http://www.jcnet.com.br/detalhe_geral.php?codigo=189020

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